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quinta-feira, 2 de julho de 2009

Break

Sempre que pego Angústia (Graciliano Ramos) para ler, sinto o livro como um espelho d'alma. Incrível como eu me identifico com o protagonista. As reflexões, os questionamentos, as observações, todas as nuanças parece que vieram de mim.

Chego cedo à universidade. Sento-me a uma mesa na cantina local, arrumo meus materiais e vou ao balcão.
- Dois bolos-bacia por favor.

Com data de fabricação não tão recente, massentos, tento saboreá-los com muito boa vontade. Uma paisagem barulhenta e jovial me circunda. Tento entender aquele zunido, aquele burburinho indecifrável de tantas vozes juntas. Não sei como todas as vozes se entendem. Alguma coisa devem ter em comum.

Olho ao redor. Quando meus olhos param de circular e fixam-se numa só imagem, mesmo que por pouco tempo, consigo decifrar alguns sons. Inútil. Imediatamente, meus incansáveis olhos voltam a percorrer todo o ambiente. Num canto, um grupo de quatro pessoas joga dominó. Dominó barulhento, frenético. E inútil. Perto de mim, duas moças conversam sobre amor. Mas têm que conversar tão alto? Como conversam alto, meu Deus. Volto ao bolo-bacia. Para disfarçar meu ócio, penso em me levantar e comprar mais alguns, mas tenho que guardar uns cobres para o almoço.

Quem começa a divagar agora é a mente. Como deve ser a vida dessa gente que joga tanto dominó e que fala tão alto? Será que reflete, entristece, chora? Ou considera a vida uma pérola fora da ostra? Se sim, não acredito que viva plenamente ou que seja feliz. É preciso olhar a concha para entender a beleza da pérola. Acima de tudo, é preciso refletir sobre a história da pérola para saber apreciá-la. Aí sim entenderia que só quem conhece a tristeza pode ser feliz.

E volto à mesa. Decido que basta de pensar por aquele momento. Sento sobre o caixão de ideias, cruzo as pernas e expiro minhas preocupações ao vento, que, de longe, me traz um aroma campesino carregado de tranquilidade e leveza.