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segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Paradigmas

A convivência dita nossos costumes, nossos limites, nossos paradigmas. A convivência pluralizada nos permite a quebra desses costumes, desses limites, desses paradigmas. Eu não acreditava nisso. Achava que não existia a tal quebra de paradigmas, até que comecei a quebrar alguns.

Desde que entrei na Aiesec, fui compelido a sair da fantasiosa geometria em que se encontrava minha vida. Tudo era muito idealizado, amorfo, estático. Meus conceitos eram pré-concebidos, sem uma base lógica que sustentasse as conclusões que deles derivavam, e que eu já tinha como resolutas. Pra mim, as características de uma pessoa eram conjuntos de comportamentos que só existiam em conjunto. Só pra ilustrar: uma pessoa inteligente só pode ser séria, então é contida, o que implica que não pode se socializar. Se essa pessoa supostamente inteligente socializar, eu já desconsiderava sua inteligência, ou a via com muito maus olhos.

Basicamente foi essa filosofia que regeu minha vida até então, e foi essa filosofia que me privou de tantas oportunidades que tive na vida. E eu nem me dava conta dela.

Felizmente, mesmo que inconscientemente, consegui desmontá-la, graças principalmente à viagem de dez dias que fiz a São Paulo, com a Aiesec Recife. Convivendo com esse pessoal, vi que eu precisava trair o aprendizado de vida que me guiava. Por exemplo, nunca tinha me imaginado dançando espontaneamente. Ainda mais num ambiente com mais de 400 pessoas de todo o Brasil, gente totalmente desconhecida pra mim. Mais estranho ainda é que dancei músicas que nunca tinha ouvido antes. Às 7:30 da manhã. Mas isto é que conjugaria mesmo o crime: eu gostei.

A lição que tive é que a personalidade de uma pessoa é composta por traços pontuais (não pense geometricamente) de diversas personalidades, com uma contribuição muito pequena de cada traço para o caráter dessa pessoa. Antigamente, eu vislumbrava apenas um ou dois traços e já projetava todas as suas características, o que me rendeu muitos desapontamentos e muito desânimo nas pessoas que conheço.

(É interessante que, enquanto escrevo, me passam na mente indagações que eu fazia quando tinha treze ou catoreze anos. E com a filosofia que construí com esses paradigmas que quebrei recentemente, descobri a solução para o principal questionamento meu da época: "por que perdi a fé nas pessoas?". Ora, eu não aceitava as características conflitantes que detectava na personalidade delas, então eu não entendia essas pessoas; sem entendê-las, é impossível acreditar nelas.)

domingo, 11 de outubro de 2009

Chopin

Reencontrei os prelúdios de Chopin. São a ponte do mundo físico a aquele que só nossas emoções podem tocar.

http://www.youtube.com/watch?v=au8Tjg5roX8

http://www.youtube.com/watch?v=2JsuiQ-8Ks0&feature=related

http://www.youtube.com/watch?v=-J8XbIOz1xk

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Resposta

Talvez seja besteira e inútil eu te dizer isto, mas fui sincero em todas as declarações. Sincero como nunca tinha sido comigo mesmo. Você era a minha mais forte e única verdade.

Durante esse tempo, revirei meus humores em busca das minhas verdades, outras verdades. Talvez uma incursão desse tipo seja a mais dolorosa que alguém pode fazer.

Numa sessão com a psicóloga, depois de lhe ter relatado alguns desassossegos, ela me aconselhou e quase me obrigou a consultar um psiquiatra. Eu, sem pensar muito, aquiesci, convencido de que provavelmente me daria um alento em momentos de angústia. Mas, digerindo o assunto durante o dia, não aceitei. Foi aí que percebi uma coisa que norteia minha vida desde sempre: meu maior medo é o de ficar anestesiado, inerte, perder minha sensibilidade. Foi uma descoberta reveladora.

Eu quero ver todas as mazelas do mundo, quero sentir todas as mazelas do mundo, quero degustar todos os espinhos do mundo se isso for o necessário para não me anestesiar. As coisas do mundo só estão assim por causa da indiferença, da anestesia. A indiferença ao mundo me causa desdém, ojeriza, mesmo que muitas vezes eu seja indiferente a mim mesmo. Essa é a minha maior verdade. Minha plenitude talvez esteja no contraste de cada grão de amargura e felicidade que colher.

Marasmo

Da mesma forma que, de repente, nos ocorre um estalo de boa vontade e de bons humores, surge-nos, também de repente, um filete de melancolia e languidez que pode se avolumar e nos tomar o domínio da vida.

É parte das estações da vida, que nada têm que ver com aquelas a que estamos habituados e mecanizados a memorizar. É quando sentimos o ar que normalmente respiramos nos sufocar brandamente; é quando as veias e artérias que nos irrigam dilatam-se e nos tomam mais espaço do que o comum, sentimo-nos pressionados por nós mesmos; é quando o coração bate mais depressa por nenhuma razão aparente, a temperatura corporal sobe, somos impelidos a respirar fundo, a repousar a mão direita no peito esquerdo para tentar conter o ímpeto daquele órgão que é mais imaterial que físico.

No nosso inverno, refletimos. Daí a provável causa para tanta tempestade.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Ver

Sempre vejo os meninos de rua na Agamenon Magalhães, a maioria dos quais cheira-cola. É-me triste ver gente assim, mas os continuo olhando. Queria poder fazer alguma coisa para mudar.

Surge alvorada

Há aqueles dias em que tudo parece nos afagar, nos sorrir. Ainda não sei qual a certa razão de isso acontecer. Pode ser meramente uma confluência de felizes acontecimentos, ou então um inconsciente maquinário cíclico no nosso ser que precisa alternar entre bons e maus humores, ou um maquinário não tão inconsciente assim. Um simples estalo ao acaso e tudo aquilo que está e sempre esteve na sua frente toma sons, cores e olores nunca antes percebidos.

É quando a vida desabrocha e entramos na nossa primavera. Repito que isso me suspeita cíclico, mas não perde sua beleza. Beleza que nos vem em eflúvios vertidos por situações, coisas inanimadas, coisas vivas, não-coisas que antes apenas nos observavam e nós a elas. O violão, a clarineta, o violino vibram-nos a mais interna orquestra e nos regem a mais exuberante sinfonia. Jasmins, gardênias, nenúfares inundam o ar com o mais tênue e revigorante olor. O púrpuro contraste do fim do dia com o começo da noite harmoniza-se com os nossos próprios contrastes. A limitação das palavras para descrever tais sensações é óbvia mas infelizmente temos de nos acostumar a essas limitações e usufruir o melhor delas.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Prisioneiros

"Que estranha cena descreves, e que estranhos prisioneiros. São iguais a nós"
Essa frase de Platão retrata bem a vida, ou os reféns da vida. Somos prisioneiros da liberdade dos outros. Apesar de toda aquela ladainha que estamos cansados de ver em livros de auto-ajuda, propagandas mal-intencionadas, Ana Maria Braga e afins, continua-se a impor o "normal" a nossa mente; e, apesar de isso ser tão discutido, continua-se a aceitar o "normal".

"Você é livre?" Acho que hoje, muita gente que fosse abordada de supetão com essa pergunta, no mínimo pararia para pensar. As amarras, as correntes, as mordaças que nos são impostas já vêm sendo percebidas na nossa consciência, com os tantos de alardes que nos têm sido feitos. Mas então por que se continua a aceitar essa privação do "think outside the box"?

O problema é que, pelo fato de essa questão ser tão abstrata, tão aparentemente banal, seu poder muitas vezes é menosprezado. E o que piora exponencialmente é que o nosso ser praticamente já nasce sob essas regras tácitas, servindo de ressonância para os estímulos consumistas que nos permeiam. Precisamos trocar de carro a cada dois anos, precisamos comprar o celular que acabou de ser lançado, precisamos instalar uma internet de 5mb/s, precisamos comprar a câmera mais leve, precisamos comprar roupas toda semana (abuse e use), precisamos comprar tv de plasma. Tudo isso já nos vêm à mente automaticamente no primeiro traço de defeito técnico do nosso produto, mesmo que muitas vezes essa percepção já seja uma predisposição nossa a encurtar ao máximo a vida útil de nossos utensílios.

Essa reflexãozinha me veio ao ler A caverna de Saramago. Aliás, recomendo que o leiam. Como toda obra dele, sempre há uma crítica ao consumismo e ao capitalismo desenfreado. Bem a minha cara.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Break

Sempre que pego Angústia (Graciliano Ramos) para ler, sinto o livro como um espelho d'alma. Incrível como eu me identifico com o protagonista. As reflexões, os questionamentos, as observações, todas as nuanças parece que vieram de mim.

Chego cedo à universidade. Sento-me a uma mesa na cantina local, arrumo meus materiais e vou ao balcão.
- Dois bolos-bacia por favor.

Com data de fabricação não tão recente, massentos, tento saboreá-los com muito boa vontade. Uma paisagem barulhenta e jovial me circunda. Tento entender aquele zunido, aquele burburinho indecifrável de tantas vozes juntas. Não sei como todas as vozes se entendem. Alguma coisa devem ter em comum.

Olho ao redor. Quando meus olhos param de circular e fixam-se numa só imagem, mesmo que por pouco tempo, consigo decifrar alguns sons. Inútil. Imediatamente, meus incansáveis olhos voltam a percorrer todo o ambiente. Num canto, um grupo de quatro pessoas joga dominó. Dominó barulhento, frenético. E inútil. Perto de mim, duas moças conversam sobre amor. Mas têm que conversar tão alto? Como conversam alto, meu Deus. Volto ao bolo-bacia. Para disfarçar meu ócio, penso em me levantar e comprar mais alguns, mas tenho que guardar uns cobres para o almoço.

Quem começa a divagar agora é a mente. Como deve ser a vida dessa gente que joga tanto dominó e que fala tão alto? Será que reflete, entristece, chora? Ou considera a vida uma pérola fora da ostra? Se sim, não acredito que viva plenamente ou que seja feliz. É preciso olhar a concha para entender a beleza da pérola. Acima de tudo, é preciso refletir sobre a história da pérola para saber apreciá-la. Aí sim entenderia que só quem conhece a tristeza pode ser feliz.

E volto à mesa. Decido que basta de pensar por aquele momento. Sento sobre o caixão de ideias, cruzo as pernas e expiro minhas preocupações ao vento, que, de longe, me traz um aroma campesino carregado de tranquilidade e leveza.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Conversa de botequim

- Seu Bira, tem tapioca hoje?
- Tem sim, seu Felipe. Vai querer de coco e queijo?
- Claro, duas.
- Já vai, patrão.

E seu Bira espalha a goma da tapioca na panela do fogão a carvão, onde não se vê uma chama crepitar, no máximo algumas fagulhas.

- Sou casado há 17 anos... De um ano pra cá, a mulher só tem sido problema. "Vai sair com quem?, que amigos?, volta a que horas?". Bicho, que inferno, é um inferno. Tu é solteiro né, patrão?
- Claro, claro.
- E que bicho sortudo. Olhe, pense numa queimação esse negócio de casado. Antigamente era uma maravilha, a gente só se divertia e era só alegria. Depois, os dois velhos já, vixe, fica insuportável.

A goma começa a tomar forma, os pequenos grãos de mandioca ralada começam a dilatar-se e a juntar-se uns aos outros.

- Tem hora que dá vontade de dar-lhe uns dois apertões, daqueles bem dados mesmo, sabe qual é?, pra ela parar de implicar.

E começa a jogar o coco pela massa, que já tem uma textura borrachuda.

- Lá na favela tem um cara que a gente chama de Arroz. Agora imagina por que é arroz.
- Hum...?
- O cara foi dar-lhe na mulher e ela tava na cozinha com uma panela de arroz quente. Jogou tudo no rosto do cara - segue uma gargalhada seca e estridente -. Também tem Café. Já sabe por que do café né? - e flutua no ar um breve olhar capcioso, do qual surgiu outra gargalhada sardônica.

A colher já retira do recipiente duas fatias de queijo coalho, que ficarão sobrepostas à fina camada de coco. As tapiocas estão quase prontas.

- Mas agora não dá nem mais pra gente fazer isso. Tem aquela lei, Maria da Penha, né, aí a gente fica tudo com medo. Antigamente não tinha dessas coisas... Já já é a gente que vai apanhar das mulheres né não? - mais um riso, dessa vez mais simpático.

E as tapiocas ficam prontas. Volto sem pressa para casa, pois elas demoram a esfriar.

sábado, 23 de maio de 2009

Cultura: até onde?

O livro que acabei de ler, O livreiro de Cabul (Asne Seierstad), é basicamente um relato do dia-a-dia e dos problemas de uma família do Afeganistão. A autora, que também é jornalista, ficou hospedada numa casa de classe média alta para os padrões afegãos, e lá pôde presenciar todos os impasses do anacronismo do Islã.

"O valor de uma noiva está no hímen; o valor de uma esposa está em quantos filhos homens ela põe no mundo". Essa frase do livro retrata bem um legado cultural que, ao olhar ocidental (do qual, logicamente, faço parte), soa absurdo. Lá, as mulheres não podem sair sozinhas nem para comprar cebolas; não podem abrir empresas, nem uma lojinha sequer; só podem receber cartas de parentes, entre tantas outras restrições. O pior é que, mesmo as mulheres tendo sido moldadas ao Corão, elas sempre imaginam como seria viver no Ocidente. Muitas vezes a autora do livro registrou choros e mais choros das duas esposas do protagonista da história. A primeira esposa, a mais velha, ficou inutilizada depois dos 50 anos, não rendia mais filhos, então o marido encontrou uma outra, de apenas 14 anos. A mais velha ficou trabalhando, então, como empregada, sujeita a constantes espancamentos dos filhos, sobrinhos e agregados - na casa moravam 15 pessoas.

O livro fala muito do Talibã, regime que quer forçar os costumes para que fiquem de acordo com aqueles da época de Maomé. Eis as principais leis do Talibã: "É proibido às mulheres andarem descobertas; Músicas estão estritamente proibidas; É proibido barbear-se; É proibido soltar pipas (porque isso estimula as crianças a fugir das escolas); É proibido reproduzir imagens de seres vivos; É proibido usar cortes de cabelo no estilo inglês ou americano; É proibido tocar tambor; É proibido ficar fora de casa depois das 22h". Minha pergunta é: como um regime desses pode ter respaldo popular?

Uma passagem que me marcou no livro foi a da morte de uma jovem menina. Uma jovem de 14 anos, que chamaremos de Sharifa, estava na cozinha, preparando o alimento da casa, quando chegou um amigo de um dos três irmãos. Chamá-lo-emos de Rajid. Quando Sharifa foi servir a comida no tapete na sala, Rajid, num breve olhar (já que não se deve olhar diretamente à empregada da casa), encantou-se com a jovem. A partir daquele momento, ele escreveria longas cartas de amor prometendo tudo a Sharifa, que, por sua vez, recebia as cartas escondidas em caixas de alimentos. Um sentimento de excitação, amor, paixão tomava conta do intocado coração de Sharifa. Era uma coisa totalmente nova para ela. Até que Rajid resolveu ousar: combinou um ponto de encontro entre os dois, coisa estritamente proibida na cultura muçulmana. Sharifa, tomada pelo turbilhão, encontrou uma desculpa qualquer e conseguiu sair de casa por um tempinho. Na praça perto de casa, estava Rajid escondido esperando por ela. Encontraram-se e furtivamente se tocaram pela primeira vez.

Na rua, no mesmo momento, passava o carro de um dos irmãos, que viu toda a cena com a irmã. Prontamente avisou aos pais, que ficaram perplexos: como é possível uma jovem encontrar-se com um jovem? Isso seria vergonhoso para a família; a sociedade, os amigos nunca mais quereriam conviver com essa família impura e irresponsável. Sharifa não poderia mais se casar com ninguém, estaria fadada a morrer na miséria.

Pensando nisso, a família resolveu tomar providências. Numa noite, Sharifa dormia no seu tapete, junto com todos os outros agregados da família. Então, os três irmãos, a mando dos pais, entraram imperceptivelmente no quarto, pegaram uma almofada, e envolveram-na no rosto da irmã durante alguns minutos, até que Sharifa caiu morta no chão.

Isso faz parte da cultura muçulmana. O que se pode fazer?, dizer Sua cultura está errada? É uma questão muito complicada. Mas até que ponto manter uma tradição milenar é benéfico?, até que ponto esse anacronismo vai existir?, não é possível uma modernização das tradições?

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Em falta

Tem faltado poesia ultimamente. Os dias andam abafados e tortuosos, e as palavras derreteram e se dissiparam.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Barreiras

Disse-me uma pessoa próxima, ao ouvir o alto som do rádio do carro que passava perto, Aposto que esse cara é um daqueles idiotas que usam colar de prata, brinco, anel...

Tribunais de vários estados brasileiros impediram a realização da Marcha da maconha, evento organizado mundialmente. O direito à livre expressão só é livre se o juiz der ganho de causa.

Mulher de uma cidadezinha de Minas Gerais é condenada à prisão e a pagamento de multa por difamação, depois de relatar num jornal de 500 exemplares/dia a situação do presídio da cidade, explicitando todos os pormenores dos desmandos dos diretores da cadeia.

Não suporto som alto, seja de qualquer gênero. Acho essa atitude extremamente desagradável e de mau gosto. Mas que linha de raciocínio, senão um lapso de consciência ou uma pseudoconsciência no vácuo, conseguiria associar o estilo de se vestir da pessoa com esse flagrante de falta de bom senso? Como uma manifestação meramente externa interfere no intelecto da pessoa? Eu, quando cultivei um rebelde e inusitado moicano por um tempo, não me senti mais burro de absoluto. Aliás, foi com ele que fiz a segunda fase da Federal.

Sou contra a descriminalização da maconha por diversas razões, mas é inegável que essa corrente tem agregado boa parte da população brasileira ultimamente. E, naturalmente, essa parcela vai querer pelo menos abrir um canal de discussão a fim de mostrar seus propósitos, já que tem respaldo para tal na Constituição. São-lhes problema, porém, a mesquinhez e o conservadorismo anacrônicos daqueles que interpretam nossas leis. E o direito a manifestar-se é soprado pra longe, como fina areia, carregando grãos que talvez nos vingassem algo.

São exemplos como esses que caracterizam o Brasil como um país com pouca liberdade de expressão, segundo a OEA, Organização dos Estados Americanos. Barreiras que devem ser superadas aos poucos, e que se comece no individual.

sábado, 2 de maio de 2009

Esperança

Um vídeo que me deu esperanças. Clique aqui para sentir o gosto de um Brasil que pode mudar.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Alegria

Quarta-feira, 22 de abril de 2009. Acordo sobressaltado, com a melodia do "Vamos vamos meu leão" na cabeça. Visto meu manto rubro-negro e vou à faculdade, onde encontro um verdadeiro reduto de fiéis torcedores do Sport: camisas das mais variadas épocas, mas todas com o escudo do Leão.

Mal voltei da universidade, já fui me aprontando para o jogo; vestindo a camisa, me percebi trêmulo, nunca estivera assim antes. Cheguei ao estádio às 19h, três horas antes do início. Nesse meio tempo, li jornal, esquentei os pulmões com a torcida e parei de tremer.

Começa o jogo. Primeiro tempo sem nada de extraordinário; os times já estão voltando para a etapa complementar. Logo cedo, o adversário marca o gol. Foi um desânimo total na torcida, toda aquela ansiedade por uma vitória tinha evaporado, o olhar se enegrecia, os pulmões se encolhiam, o coração batia sincopadamente. Mas dez segundos depois, estávamos lá, cantando de novo, foi um momento emocionante, e tenho certeza de que o time sentiu isso.

Dez minutos depois, o Sport chuta uma bola na trave, e, no rebote, de primeira, Moacir chuta a bola e a tira do goleiro. A torcida só esperava a fagulha encontrar o rastro de pólvora, e explodiu. Foi sem sombra de dúvidas a maior emoção que senti nos últimos tempos. A tristeza tinha evaporado, o olhar brilhava, os pulmões se intumesciam e se enchiam daquele ar carregado de cristais de esperança e confiança, o coração batia ao ritmo do cazá cazá. Estávamos entregues ao torpor, e alguma coisa nos dizia que viraríamos, garantindo a inédita classificação à próxima fase.

E o gol veio, aos 35 minutos do segundo tempo. E a certeza se consagrava, e a noite ficava clara como o zênite, e o duro concreto das arquibancadas nos impulsionava cada vez mais alto, e a voz, que se ia cansada, não precisava sair para que gritássemos. E descobria eu que tudo se faz de pequenas emoções, aparentemente inócuas e banais, mas que, quase sem percebermos, nos regam com imaginação e bom humor, essenciais para se decifrarem as mensagens da vida.

sábado, 18 de abril de 2009

Umas rimas

Falam que na matemática
Não se criam mais que números
Vejo apenas numa sátira:
A tal ideia é um cúmulo.

Logo bem nos presenteiam
Com esta simples adição:
Somem tudo a que anseiam
E lembrem sempre do irmão.

Adiante é conhecido:
Sem tirar nós não vivemos
Tire tudo que é sofrido
Viva mais e com bem menos.

Quero então a igualdade
Junto a ela a divisão
E para quem de nada sabe
Já formei uma fração.

Continuo essa marchinha
Com o vezes que me pena
E resolver essa continha
É o xis do meu problema.

Vejo o povo na patada
Com essa tanta teoria
Mas quem disse que em exatas
Não havia poesia?

FDBO

domingo, 12 de abril de 2009

Politicagem

Fiquei estarrecido com a capa da revista CartaCapital da semana passada. Nela se via Renan Calheiros garbosamente alinhando seu terno, e, logo abaixo, lia-se "Ainda por cima, Calheiros?".

Essa figura, o alagoano Renan Calheiros, já está há muito tempo na vida política brasileira. Atualmente, ele está refestelado nas acolchoadas poltronas do senado. Depois de quase ter sido cassado por causa de um ingênuo deslize (uso de terceiros para pagar contas pessoais) no período em que era presidente da casa, ele ressurge das cinzas e já mobiliza todo o seu exército de paladinos senadores para sair em sua defesa. E o pior: esse exército se envereda por todas as esferas do poder, até mesmo o Presidente da República, um ídolo meu, apoia Renan.

É bem simples o esquema de Calheiros. Tudo começa com os funcionários recém-chegados. Por exemplo, o novo secretário-adjunto do terceiro secretário da assessoria de imprensa de um determinado senador é convidado a um jantar com o nosso amigo RC. Lá, eles firmam pactos de amizade e companheirismo permeados de muitas promessas de cargos comissionados. Em compensação, é exigido que esse tal funcionário lhe acelere algumas papeladas de forma que os interesses de RC se propaguem de forma mais rápida e eficaz. "Me garanta seu voto em meu favor em tais projetos que lhe dou tais cargos". Assim ele reconquistou seu espaço na política, assim ele reatou as pontas do poder, assim ele se manteve na alta sociedade com Collor, FHC e Lula, mesmo com governos tão diferentes. E assim se constroi a rede de direitos e deveres dos excelentíssimos representantes do povo no poder.

O próprio RC reconhece os poderes com que se regozija. Questionado se se candidataria a governador das Alagoas, respondeu: "Pra quê, se aqui eu tenho muito mais poder?". Pois é, esse RC é todo prosa...

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Valseando a vida

E a vida se constrói nos mínimos detalhes. A criança que se esperneia nos braços da mãe, daí vem o estridente choro que só a afinada garganta de um pré-jovem consegue executar. E o bar por perto, no qual se lê: Temos coroas. Me pergunto se a prevaricação já chegou à terceira idade, provavelmente não, deve ser somente uma nova mutação das palavras. Ah, as palavras, tridimensionais como ninguém, versáteis, amorfas, mas ao mesmo tempo limitadas pelo pensamento. Palavras são papagaios do pensamento, já disse Saramago.

Num alpendre daqueles anos-20, um casal discute o relacionamento, isso nos é tão inócuo, tão indiferente, como todo o ambiente que nos circunda no-lo é. E se vê um rosto. Aquele rosto. De onde mesmo? Já vi esse rosto. E se passa todo o tempo descuidado a se tentar se lembrar, até que se passa outro rosto: de quem mesmo? Mas essa rotina nos inflige danos irreparáveis... Já um restaurante exibe um cartaz: self service sem balança. Inteligência da nova burguesia, assim se poupa o cliente de se espantar com o peso do prato, finjo que não sei, finjo que não vi, então não me repreendo.

A tinta dos muros é ofuscada pelo brilhante-ao-sol spray das pichações. Ué, aquele piche não parece um hiragana?

E parece ser inevitável: por mais feio que se seja, por mais repugnante que se seja, sempre há alguém que lhe segue com o olhar, como se percebêssemos uma perturbação eletromagnética que se faz presente no exato momento em que um olhar nos é direcionado. Ah, aquelas graciosas moças que fazem do concreto sua passarela, que nos desviam do trânsito, que nos arrebatam uma saudade do último amor, ou do presente amor, ou uma vontade de um futuro amor.

Passa um carro auto-escola. Uma só pessoa no carro. Inegavelmente, é uma auto-escola por definição. Desviamo-nos da floresta de arranha-céus, mera imitação humana da natureza das sequoias. Essas árvores de cimento, tijolo, vidro, concreto, plástico, aço, ferro, petróleo, aquecimento global, efeito estufa, poluição. Adiante, num poste, se lê: Dor de coluna agora tem tratamento. Com certeza um poste não é um bom lugar para se expor a descoberta de um tratamento para a avassaladora destruição do humor a que a coluna nos subjuga.

Ali, sempre ali, àquela hora, se senta uma charmosa moça. Com suas pernas cruzadas cobertas com uma discreta calça lisa, cabelos negros e lisos amarrados sobrepostos ao harmonioso colo, que se deixa sublevar com o inspirar, expirar, inspirar, expirar, parece à espera de alguém em quem possa se amparar, se afagar, se deixar, se sorrir. Subitamente, não tão longe dali, a luz de um sorriso se propaga, como um candeeiro numa obscura caverna, sua alva tez agora traz contornos de certeza, finalmente o arrebatador da solidão lhe chegava, sua beleza resplandece como Jaci em límpidas e diáfanas águas, faz-se um espetáculo neste observador, que só contempla esse corriqueiro viver. E, a distância dos holofotes, a pequena vida acontece.

segunda-feira, 30 de março de 2009

O encanto

Nesses dias, tenho me perdido nos corredores de algumas reflexões. Claro, quase todas são baratas e inúteis, mas me é prazeiroso observar os grãos de areia da ampulheta apressando-se a escorregar ao nível abaixo. Isso me faz pensar que o tempo não é o que bem dizem os relógios, meras maquinetas desprovidas de qualquer capacidade de percepção, que não sabem diferenciar, por exemplo, cinco segundos de espera numa fila qualquer e cinco segundos de um divino silêncio durante o qual dois amantes se fitam candidamente. O tempo é a mais subjetiva das grandezas físicas, é uma coisa só nossa.

No meu reduzido círculo de contatos, tenho percebido como o amor abobalha o ser humano. Isso é incrível. Ouço (em inglês, o termo correto seria eavesdrop) aquelas palavras afetivas, aqueles apelidos, aqueles carinhos, e me é impossível não me transportar à minha segunda série do ensino fundamental, quando não precisava do amor para ficar abobalhado. Muitas vezes, obviamente, essas minideclarações são muito mais bonitas do que sinceras, mas isso não tira o encanto que o amor nos provoca.

Estamos sempre à mercê da correnteza do tempo: a idade nos joga um jato d'água fria a cada nova velinha no bolo, a alvura dos cabelos nos alerta que nossa aquarela está desbotando, as rugas na pele são mostras de que a alma já não mais sustenta o corpo. No entanto, eis que surge o amor, como um fenômeno anticíclico, um estranho que nos arrebata e nos protege da luz negra de um destino cruel. Eis que o ciclo da vida é interrompido e girado no sentido contrário. Eis que o tempo se maleabiliza, flexibiliza-se, dispersa-se; enfim, seu rigor arrefece. Agora, os grãozinhos da ampulheta esforçam-se a subir o escorrego à câmara superior. E a vida nos ressurge, e a vida amanhece.

domingo, 29 de março de 2009

Uns contos

No mundo da música clássica, apesar do eruditismo que lhe é tão peculiar, há tantos casos curiosos e engraçados que nos fazem pensar: aqueles compositores tinham muitos problemas.

Vou começar com um dos maiores gênios. Mozart sempre foi um rapaz extravagante, extrovertido, até inescrupuloso. Chegou a faltar a uma apresentação porque havia conhecido uma bela moça na ante-sala do teatro, e por lá ficou, com ela, desfrutando dos prazeres carnais que o dinheiro pode trazer. Na adolescência, o jovem gênio se apaixonou por Aloyse Weber, uma talentosa cantora de família tradicional. Tiveram um breve caso que envolveu tanto o compositor que já pensava no casamento. Entretando, Aloyse não sentira a mesma coisa, e logo que pôde, dispensou-o. Então Mozart se desesperou. Sentiu-se um fracassado, um incapaz, um impotente, um nada! Mas, como dizem sabiamente os jogadores de futebol, tinha que levantar a cabeça e preparar novas investidas. E foi o que ele fez. Resultado: acabou se casando com Constanze Weber, irmã de Aloyse.

Outro caso pitoresco é o de Tchaikovsky, compositor de belas melodias. Sua história não toma muitas linhas. Simplesmente ele quase se suicidou porque teve que se casar com uma mulher para esconder da aristocracia sua opção sexual. Já Chopin, depois de tantas desilusões com as mulheres, terminou por se casar com Aurore Dupine, mais conhecida como George Sand, notável senhora que se vestia como homem.

Temos também o caso de Schumann, compositor e pianista da Alemanha. Para começar, ele só tinha nove dedos nas mãos. O polegar direito era defeituoso e teve que ser parcialmente amputado. Isso, para um pianista, é como perder 10% da sua habilidade. Ainda pior: quando jovem, foi diagnosticada uma doença mental progressiva, quanto mais velho ficasse, maiores loucuras iria cometer. Depois de várias conversas com o finado pai, depois de várias internações em sanatórios, ele terminou por tentar o suicídio. Jogou-se de uma ponte, ainda com a camisa de força lhe espremendo o desejo (não sei como ele fugiu do hospital com essa camisa...) e caiu no gélido rio que cortava a cidade. Foi resgatado, mas morreu só, na sarjeta. Depois da sua morte, ficou-se sabendo que sua mulher, Clara Schumann, mantinha relações extraconjugais com outro grande compositor, Brahms. Definitivamente, Schumann não era feliz.

Agora casos curtos. Beethoven estava numa carroça voltando para casa quando a roda do veículo enguiçou. Não foi possível o conserto, então toda a viagem se seguiu com aquele grunhido da roda de madeira, "nhéém, nhéém". Era disso que Beethoven precisava. Genialmente, percebeu o ritmo e a melodia e já foi matutando sua sexta sinfonia. Quem a ouvir vai perceber a repetitividade da melodia, e ainda os agudos dignos de uma roda enguiçada. Bernstein, compositor norte-americano, já declarou numa entrevista que muitas das melodias de suas músicas já existiam ou foram aprimoradas por ele. Seria um impostor? Não, ele simplesmente passava a tarde toda, todas as tardes, no Central Park, em Nova Iorque, ouvindo o que as pessoas assobiavam, então ele misturava tudo e só espalhava uns sopros de tuba aqui ou lá.

Enfim, este post saiu um pouco dos meus padrões, porque quero transformar este blog num recanto mais ameno e diversificado. Aliás, é comum que o teor dos posts venha acompanhado pela maré do meu humor. Incrível o que o término de uma semana de provas pode fazer ao humor de alguém.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Ao som da lira

O aprazível clima que me foi trazido pela chuva me desperta no tato e no olfato aquele ambiente agradável, onde temos de nos abraçar a alguém para nos ser saciada a fome do calor.

Nós, estirados no sofá-cama, esparramados de muita massa italiana, azeite, amor e beijos. Durmo nos braços dela, ou ela nos meus, afinal revezávamos. Vejo que seus olhos estão fechados, talvez se questionando no íntimo, no escuro, se tudo isso lhe é real, ou se uma hora as cortinas irão fechar-se e o palhaço rir-lhe da cara. Rugas de preocupação se lhe surgem no rosto. Discreta e suavemente, verto-lhe um delicioso e sincero beijo na testa, com medieval cautela. A diáfana cortina dos seus olhos me é descoberta acompanhada melodiosamente por um sorriso daqueles que só aparecem quando a felicidade é tão grande que precisa extravasar.

Ah, aquelas noites, só nós, e isso bastava. Esperávamos o nada acontecer, e este, complacentemente, não aparecia. Assim se prolongavam os minutos, intermináveis, pelo menos enquanto pudesse me encasular naqueles braços. E o sono? Ah, este havia sido deixado para trás junto à tristeza e à solidão, que insistiam em me abusar o relógio.

Docemente, espreguiçávamos, já que todos os músculos estavam a bocejar - menos um, que palpitava como uma frenética maria-fumaça. A televisão estava ligada? E as palavras... flutuavam, contorciam-se, rodopiavam, escondiam-se. E então se tem um fenômeno. É como se houvesse uma constante universal acoplada à equação de atração dos corpos. Uma constante completamente abstrusa ao nosso olhar cientificista. Não se a vê, mas se a sente, sabe-se que existe. Tudo parece gravitar em torno dos dois corpos que, inexplicavelmente, aproximam-se com voluptuosidade. É tal o enlevo que transcende o real, o paupável; fecham-se, pois, os olhos, que são contaminados pela realidade e entravam a imaginação. Daí as cores e as formas têm suas rédeas desintegradas. No momento do enlace dos lábios, quando finalmente podemos sentir de perto toda a atmosfera viciante, parecemos acordar do morto mundo em que vivemos; encaixota-se e despacha-se o pensar e descobre-se o sentir, como quem abre os olhos para a verdadeira felicidade.

domingo, 22 de março de 2009

Uns casos

Este post terá caráter "meu querido diário" porque estou a fim de falar do dia de hoje, somente.

Levanto-me da cama, resisto a seu tentador canto de sereia. Primeira coisa em que penso: tenho reunião com o Olhos Abertos, um pequeno grupo de jovens da minha idade que combinaram de se reunir quinzenalmente para discutir alguns temas pré-determinados. Fico muito animado no dia do nosso encontro, simplesmente adoro falar com pessoas com quem tenho algumas características em comum.

Passei a manhã toda estudando cálculo. Incrível a mecanização que esse estudo me impõe. Aliás, é incrível a mecanização que todo o sistema nos impõe. Quem tem tempo para se expressar artisticamente? Quem tem tempo para ler?, para escrever?, para criar? Essa fria mecânica me gela o rosto, me chama ao mundo material. Não sei como a maioria da população consegue viver sem a arte, sem a espontaneidade. Deve ser muito monótono viver sem apreciar as róseas bochechas de uma criança, sem sentir o inefável prazer de beber um copo d'água, sem se arrepiar com o friozinho da chuva, sem se arrepiar com o doce e suave olor das gardênias, sem se arrepiar com uma bela passagem de um noturno de Chopin. Não consigo imaginar uma vida saudável sem isso.

Começo a imaginar como será meu trajeto para o ponto de encontro do grupo, a livraria Cultura, numa das ilhas de Recife. Decido ir de ônibus a fim de conhecer melhor a cidade. Logo depois de atravessar a ponte Princesa Izabel, avisto dois indivíduos vindo em minha direção. Olho ao meu redor e não vejo mais ninguém, a não ser um casal à mesma distância dos dois outros indivíduos. Pressinto o perigo, uma espécie de ameaça flutuando no ar, como quem percebe a massa de nuvem que cobre o céu se crispar à espera de que um trovão se deflagre. Então, apresso o passo, tentando manter a calma. Esses dois sujeitos também aceleram o ritmo até que chegam a mim. Um deles me aborda: Tem cinquenta centavos aí? Calmamente, digo que não, e, então, logo depois, o mesmo cara fala: Passa o celular. Minha mão dentro do bolso direito gelou, mas por acaso peguei o celular, mesmo que por instinto. Pela primeira vez fora assaltado. Senti como é ser refém da sociedade. Entretanto, não me abalei muito. Imaginei como deve ser a sensação de ser diariamente assaltado pela sociedade, como eram aqueles dois pobres indivíduos, que tudo o que conseguiram foi um velho e ultrapassado celular. Como deve ser a vida deles? O que será que irão fazer com o dinheiro conseguido injustamente? Quem deverá comprar um aparelho daqueles? Enfim, eu sei que eles não são totalmente culpados por isso. Pode parecer besteira, mas é o que eu realmente penso.

A discussão da reunião fica para outra oportunidade, porque agora não quero me prolongar. Vou aproveitar para saciar minha sede com um revigorante copo d'água, talvez o maior prazer que a vida nos proporcione.

sábado, 21 de março de 2009

A análise

Volto a escrever antes do que previa. Ainda mais por estar em semana de prova na faculdade.

Deu-me vontade de expressar aqui uma característica minha que particularmente me fascina: a vontade de analisar. Adianto que não há segredos no método de analisar as coisas. É tudo sempre muito igual, no primeiro plano: confronto de idéias, de conceitos, de filosofias. A análise se edifica basicamente sobre os alicerces das experiências pessoais de cada indivíduo, que, muitas vezes, deslocam o equilíbrio do pensamento para o lado que mais convém ao observador. É precisamente o peso dessas experiências na análise que deturpa seus resultados.

Sempre me considerei de esquerda. Houve vezes, até, em que me considerei comunista convicto. Há umas semanas, porém, comprei um livro de Sardenberg, este convicto no modelo de gestão de direita. Sob o pretexto da necessidade de se conhecer bem os dois lados antes de escolher um caminho, comecei a ler algumas palavras da direita. Há passagens interessantes, como o fato de o Brasil não ser declaradamente capitalista de mercado, mas um eterno socialdemocrata, quando, na verdade, adotamos todas as políticas econômicas neoliberais. Ele também fala que o Brasil não vai pra frente exatamente porque nos falta o capitalismo. O que me causa estranheza é que, para ele, não existe capitalismo de esquerda, mas só o neoliberal. Passemos adiante. Uma das ressalvas mais reiteradas do livro me foi marcante. Esse famigerado sistema neoliberal, que nos mergulhou nesta crise cujo crepúsculo cisma em se atrasar, é o mesmo que permitiu nesta última década acelerado crescimento em todo o mundo. Seja em termos de tecnologia (biocombustíveis, robótica, e mais recentemente uma provável cura do Parkinson), seja em termos de riqueza. Este termo, riqueza, merece uma projeção maior.

A riqueza a que me refiro não é a distribuição de renda. É sabido que, com a informatização da economia, o capitalismo de Adam Smith não transfere capital por osmose. Então, essa riqueza é simplesmente o enriquecimento de pessoas. Por exemplo, os mais ricos enriqueceram muito, assim como os mais pobres enriqueceram, mas bem menos. Assim, a desigualdade aumenta mas com um aumento da qualidade de vida da maioria. O que eu questiono é que, com uma maior fatia do PIB destinada a programas sociais em todo o mundo, o crescimento poderia ser bem mais equilibrado, com a maioria vivendo cada vez melhor por mais tempo.

Mas aí me vem a parte das experiências pessoais interferindo na análise. Esse sistema de crescimento acelerado... é sustentável até quando? Quero dizer, até quando poderemos intervir na natureza nesse ritmo para nos saciar a sede de capitais? Aí me fala mais alto a consciência ecológica. Há uns 10, 11 meses, eu menosprezava o papel da natureza no crescimento. Pra mim, tudo tinha que servir ao homem. Mas aí vi que simplesmente não dá para ser assim. Não podemos nos regozijar com os recursos naturais a nosso bel prazer. Temos um dever que, a meu ver, deve ser intrínseco ao ser humano: por termos a racionalidade, devemos usá-la para o bem geral. Por isso me alio à esquerda. Por isso, mesmo fazendo uso de alguns devices neoliberais, não me iludo com essa ideologia de direita. Agora me considero desenvolvimentista somente até o ponto em que os direitos da natureza são preservados, com o homem respeitando o ciclo natural das coisas. Passando desse ponto, me considero antidesenvolvimentista convicto. Acho que é isso que chamam de adepto do desenvolvimento sustentável.

Há tanta coisa para se falar desse tema mas agora não quero me prolongar mais. Não vou vomitar tudo o que eu penso em tão pouco tempo, aí faltaria assunto para conectar a próximos posts. Só queria ressaltar novamente que absolutamente tudo vem da observação. É importantíssimo aprimorar a capacidade de observação e de análise e não se deixar cegar por títulos. É fundamental aliar racionalidade com sensibilidade. Ainda estou nesse meio caminho, difícil de se trilhar. Mas depois disso, só pode sair coisa boa.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Sem faustos

Depois de algum tempo pensando, decidi, afinal, criar meu blog. Nos rincões do mundo cibernético, nas mais escuras esquinas desse tempestuoso ambiente, este blog surge. Quero deixar claro que não escrevo estas palavras para que outros leiam: o único motivo dessa minha nova empreitada é aliviar a mim mesmo desse claustro sócio-intelectual que não me tem permitido difundir minha visão sobre as coisas em geral.

Não periodicamente, devo postar por aqui. Se me ocorrer alguma reflexão que me passe pelo crivo do interessante, devo compartilhar no blog. Provavelmente alguns pensamentos sairão da diáfana barreira do bom senso e rondarão a obscuridade, a filosofia barata e axiomas totalmente inúteis. Mas enfim tenho a necessidade de passar adiante algumas coisas.

Como matéria de opertura, gostaria de divagar sobre algo que se tem perdido nas enérgicas mas mecânicas rotinas: a observação. Todos os dias, eu volto da UFPE no famigerado ônibus Rio Doce/CDU. São 22km de viagem, 1h 30min sob o branco sol do meio-dia. Enquanto a maioria se deleita, no seu reduzido espaço, com MP3 ou seja lá qual for o device eletrônico, eu me contento com a observação. Procuro me sentar na cadeira da janela, para maior conforto. Então começo a olhar para a paisagem que se move. Vejo o rosto de quantas pessoas puder. Sempre olhando nos olhos, não sei bem por quê. Talvez assim eu possa decifrar aquelas rugas, que podem ser de um baque momentâneo ou de algo que já vem de muitos invernos. O interessante é que todo o mundo tem suas rugas. São aqueles empecilhos que nos impedem de seguir adiante. Isso fica muito claro quando se toma um tempo a observar as pessoas.

Uma coisa que me tem acompanhado desde sempre nestas observações, é que eu não consigo olhar para a pessoa do meu lado. Não dá. Me reservo a escutá-la, a perceber-lhe alguns movimentos, ou, quando muito, a decifrar seu reflexo no vidro da janela. Mas não olho pro lado. Simplesmente me sinto mal. E o resultado disso: um tremendo torcicolo, todos os dias. Deixemo-lo de lado. Não gosto muito de fazer associações em planos tão diferentes, mas será que o fato de eu não olhar pro lado explica a dificuldade que tenho de me definir?, de olhar para mim mesmo e identificar minhas próprias rugas? Não sei mesmo.

Enfim, uma outra constatação que me preocupa é a baixíssima quantidade de sorrisos que me refletem resquícios de alegria. Muito poucos sorrisos. Isso é preocupante, há alguma coisa que não está certa. Não sei bem o que deve ser, mas lá vão meus cegos tiros. Rotina exaustiva, carga de trabalho exaustiva. Motivos óbvios, endossados pela poluição, pela poeira que teima em acompanhar a trajetória dos ônibus, pelo sol que nos irradia tanto ultravioleta que nos torra a paciência num clique. Ok, mas como melhorar isso? Essa pergunta projeta uma sombra enorme. Se eu for discorrer sobre isso, não vai dar certo. Deixe-se pro próximo post, quando eu estiver a fim.

Só pra concluir, queria resgatar o hábito da observação. Tudo vem com a observação. Isso é o princípio de tudo. Nunca deixemos de lado esse poder. Em outros posts, vou falar mais sobre o que tenho observado e mais algumas filosofias baratas.